30.11.09

“Ô negócio chato da peste esse canal...”

Canal da Transposição devasta a caatinga

Do lado esquerdo do bebedouro, dois carros-pipas e cinco caçambas estão perfiladas. Do lado direito, uma faixa anuncia a 1° Semana Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho (SIPAT), agendada para esta semana (de um a cinco de dezembro). O movimento de máquinas pesadas está tímido. É domingo no canteiro de obras do Projeto de transposição, em Sertânia (PE), 320 km de Recife.

Em frente ao improvisado refeitório do eixo leste, o funcionário Antônio Naílson, também conhecido como Macarrão, tem sua versão sobre os destinos das águas do Velho Chico. “Aqui vai ser o seguinte: cada proprietário vai ter um afluente de água. Agora você fica pagando a taxa. É que nem o lote de irrigação”, afirma.

Das comunidades atingidas pelos canais aos operários da transposição, a desinformação já traça seu próprio percurso pelos 220 km que ligam Petrolândia (PE) a Monteiro (PB). Numa rápida conversa com Macarrão foi possível identificar a carência de informações quanto a finalidade do projeto.

Quando questionado sobre a possibilidade de distribuir as águas às comunidades próximas ao canal, Naílson respondeu: “Eu não sei direito. Mas, pela proposta que já fizeram, dizem que a cada lado do canal vai ter cinco quilômetros de água encanada”.

Seu Rubem, que ainda não foi indenizado pela desapropriação de uma parte da sua fazenda, acredita que não terá qualquer benefício com a abertura dos canais. “Em termos de irrigação, não beneficia proprietário nenhum. Só vai atingir cidades, abastecer povoados, vilas etc”, ressalta.

Como conseqüência da devastação causada pela passagem dos tratores sobre a alta caatinga, o roubo de madeiras se intensificou na propriedade que um dia serviu de pasto para desleitar vacas. “Ô negócio chato da peste esse canal. Tão roubando madeira, o engenheiro do Ibama nunca aparece...”, afirma seu Rubem, desolado ao ver os 220 metros de largura devastados no quintal da centenária construção que um dia abrigou seus pais.

Um comentário:

Anônimo disse...

Queria parabenizar a equipe que conseguiu em poucas linhas nos mostrar a verdadeira face da Transposição. Nas matérias fica claro que esse projeto faraônico só veio trazer ainda mais desigualdade para o povo Nordestino, tão excluído, e agora perdendo uma das únicas coisas que ainda lhes restavam: a sua identidade. Precisamos reproduzir esse material para que o povo do Sudeste brasileiro veja de uma vez por todas como a vida e cultura de um povo vai indo embora aos poucos e como o "Velho Chico", nosso rio de integração nacional, vai morrendo a cada movimento das máquinas na construção dos canais. Esse é o caminho: dar Voz ao povo excluído e às comunidades do sertão nordestino atingidas pela transposição das águas do Rio São Francisco!! Força na luta sempre!! - Érika Dourado